Falência: o que ocorre quando é decretada pela empresa.

Nosso estudo hoje é voltado para a falência de empresas. Você sabe o que é a decretação de falência, se não sabe, fique conosco que vamos simplificar esse instituto jurídico.

O empresário funda uma empresa pensando em sucesso, melhorar sua vida e de seus colaboradores, entregar bens ou serviços que satisfaçam a sociedade. 

No entanto, nem sempre isso é alcançado e, por vezes, o negócio se vê em crise, afundado em dívidas e sem forças para se reerguer. Esse é o panorama que leva muitas empresas a terem a falência decretada.

Mas no que consiste exatamente a falência, para que ela serve, quando ela pode ocorrer, quais são as suas etapas e como ela se encerra?

Neste artigo, iremos responder esses questionamentos e sanar as principais dúvidas a respeito desse tão famoso e temido instituto jurídico.

O que é a falência?

De forma simplificada, a falência é um processo judicial por meio do qual é realizada a apuração e venda de todos os bens de uma empresa que não possui mais condições de pagar todas suas dívidas para que seja efetuado o pagamento em favor de seus credores.

Importante destacar que a mencionada situação de a empresa não possuir mais condições financeiras de arcar com a totalidade de suas dívidas – seu passivo é maior que seu ativo – é denominada de insolvência, que possui relevante papel para a decretação da falência.

Além disso, a falência representa o afastamento do devedor de suas atividades, com a finalidade de ser preservada e otimizada a utilização produtiva dos referidos bens, ativos e demais recursos produtivos da empresa enquanto não são vendidos para satisfazer os créditos.

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A quem se aplica e a quem não se aplica a falência?

É extremamente comum ouvirmos que fulano ou sicrano está falido, mas normalmente essa expressão é usada de modo impróprio, já que apenas o empresário e a sociedade empresária podem falir e, portanto, são os únicos destinatários da Lei de Falências.

Além disso, a falência também não ocorre para empresas públicas e sociedades de economia mistas, que são empresas controladas pela Administração Pública Federal, Estadual ou Municipal, recebendo por esse motivo uma série de tratamentos diferenciados pela Constituição e pela legislação. Há um debate sobre a constitucionalidade dessa exclusão, mas não houve ainda qualquer apreciação sobre a matéria pelo STF.

Também não são passíveis de falência determinados tipos de pessoa jurídica privada elencadas pela lei, tais como os bancos, cooperativas de créditos, planos de saúde, seguradoras, entre outros.

Essa exclusão não significa que essas empresas não possam “quebrar”, mas sim que a consequência dessa quebra não será o processo previsto pela Lei de Falências, mas sim específico tipo de liquidação empresarial delineado em outras leis.

Como evitar a decretação da falência? 

Quer dizer, então, que, sempre que alguém requerer pelos motivos explicados no tópico anterior, o juiz será obrigado a decretar a falência? Não exatamente.

Como se trata de um processo, logicamente que o devedor poderá se manifestar sobre o que está sendo requerido e, se encaixando em alguma das disposições da Lei de Falências, poderá evitar que ocorra a falência.

A primeira dessas possibilidades é o pagamento ou caução do valor da dívida acrescida de juros, correção e honorários, quando o requerimento for baseado no inadimplemento superior a 40 salários mínimos ou na execução frustrada. É conhecido como Depósito Elisivo, exatamente porque o valor depositado servirá para elidir, extinguir, o processo de falência.

A segunda forma de evitar a falência, pelo menos de forma momentânea, é o pedido de Recuperação Judicial, desde que, logicamente, sejam obedecidos os requisitos legais para esse requerimento. Como a lógica da Lei de Falências é a preservação e otimização da atividade empresarial na medida do possível, evidentemente é preferível que a empresa passe por Recuperação Judicial, por ser menos gravosa e por ter o claro objetivo de restaurar sua capacidade produtiva.

Em terceiro e último, a falência não será decretada se o requerido alegar e provar uma de várias matérias de defesa possíveis, mais especificamente as seguintes:

  • Falsidade de título;
  • Prescrição;
  • Nulidade de obrigação ou de título;
  • Pagamento da dívida;
  • Qualquer outro fato que extinga ou suspenda obrigação ou não legitime a cobrança de título;
  • Vício em protesto ou em seu instrumento;
  • Apresentação de pedido de recuperação judicial no prazo da contestação;
  • Comprovada cessação das atividades empresariais mais de 2 (dois) anos antes do pedido de falência.

E o que ocorre com a decretação da falência?

Se o devedor não conseguir evitar a falência, esta será decretada por meio de sentença do juízo falimentar, gerando uma série de efeitos para a empresa, seus sócios e credores.

Um desses efeitos é a formação do juízo universal, ou seja, o juízo falimentar torna-se competente para conhecer e processar todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido, com exceção de causas trabalhistas e fiscais, assim como de ações propostas pelo falido que não tenha relação com a falência.

Em conjunto com essa modificação de competência, o curso de todas as ações e execuções existentes é suspenso, excetuadas as ações que demandem quantia ilíquida e as reclamações trabalhistas enquanto ainda não apurado o crédito efetivamente devido ao empregado. 

Fica suspenso também o curso da contagem da prescrição de ações e execuções em face do devedor.

Outro efeito muito importante é o afastamento do devedor das atividades da empresa, sendo substituído por administrador judicial, medida tomada com o intuito de preservar e mesmo otimizar a utilização produtiva dos ativos e bens da empresa.

Além de ocorrer o afastamento, o falido também é inabilitado para exercer qualquer atividade empresarial, efeito esse que pode ser estendido para administradores e sócios pelo juízo, desde que com a devida fundamentação.

Ainda em relação ao falido, a decretação impõe inúmeros deveres que são enunciados no artigo 104 da Lei de Falências, envolvendo, por exemplo, o comparecimento aos atos de falência, a prestação de informações, o auxílio ao administrador judicial e o exame das habilitações de créditos, entre outros.

A sentença em si deverá conter uma série de determinações, dentre as quais se destacam as seguintes:

  • Ordem ao falido que apresente relação nominal dos credores, indicando endereço, importância, natureza e classificação dos respectivos créditos, se ainda não se encontrar nos autos;
  • Diligências necessárias para salvaguardar os interesses das partes envolvidas, podendo até ordenar a prisão preventiva do falido ou de seus administradores;
  • Nomeação do Administrador Judicial;
  • Pronunciamento sobre a continuação provisória das atividades do falido com o administrador judicial ou da lacração dos estabelecimentos;
  • Convocação da assembleia-geral de credores para a constituição de Comitê de Credores.

Havendo a decretação da falência, a sentença pode impugnada por meio do recurso de Agravo de Instrumento, uma vez que o processo de falência continuará normalmente seu curso enquanto é julgado o recurso. Todavia, se a sentença tiver julgado a improcedência do pedido de falência, o recurso cabível é o de Apelação.

Qual é a data da falência?

Como foi explicado em relação à caracterização da insolvência, a Lei de Falências é baseada em algumas pressuposições em relação ao falido, não interessando necessariamente a circunstância financeira que realmente ocorreu, mas sim aquela suficiente para proteger credores e demais interessados.

Da mesma forma, a data da falência é, muitas vezes, uma ficção, pois que a sentença deve fixar a data inicial sem poder retroagir mais de 90 (noventa) dias contados do pedido de falência, do pedido de recuperação judicial ou do primeiro protesto por falta de pagamento.

Ora, é sabido que o devedor pode conseguir arrastar a situação de real insolvência por um período muito maior, até de anos, contraindo empréstimos, rolando dívidas, ou até mesmo adotando condutas ilegais, mas, mesmo que fosse possível provar a insolvência anterior, a data da falência não pode retroagir além do marco legal.

A intenção da lei é clara e condizente com seus princípios, visando preservar a segurança jurídica das relações mantidas com o devedor.

Qual é a ordem de pagamentos quando uma empresa tem a falência decretada?

Após a decretação da falência, passa-se, então, a fazer a análise de quais são os bens da empresa e de quais são as suas dívidas.

Esse é basicamente o papel do administrador judicial, o qual, sempre sob a supervisão do juízo e respondendo aos credores, deverá arrecadar os bens, avaliá-los, praticar os atos necessários à venda desses ativos e ao pagamento dos credores e representar a massa falida civil e judicialmente, entre outras atribuições.

Os credores, por sua vez, participam das decisões tanto por meio da Assembleia-Geral de Credores, instância máxima deliberativa dos credores do falido, assim como pelo Comitê de Credores, formado pela Assembleia e com papel de fiscalização do processo de falência.

Assim, fica preparado o terreno para ocorrer a chamada “realização do ativo”, que nada mais é que a venda de todos os bens da empresa, conduzida pelo administrador judicial e sob a supervisão do juiz, dos credores e também dos devedores, estes últimos já afastados da gestão da empresa falida.

Essa venda pode seguir algumas formas, com a seguinte ordem de preferência legal: 1) alienação da empresa, com a venda de seus estabelecimentos em bloco; 2) alienação da empresa, com a venda de filiais ou unidades produtivas separadamente; 3) alienação de conjuntos de bens que integram os estabelecimentos; ou 4) alienação dos bens separadamente. Eventualmente, pode ser adotada mais de uma dessas formas em conjunto.

Por fim, ocorre o pagamento dos credores, conforme a ordem de prioridade legal: 

  1. Os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho;
  2. Créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado;
  3. Créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuadas as multas tributárias;
  4. Créditos com privilégio especial, como os em favor de MEI, ME e EPPs;
  5. Créditos com privilégio geral;
  6. Créditos quirografários, como o saldo dos créditos trabalhistas superiores a 150 (cento e cinquenta) salários-mínimos;
  7. As multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, inclusive as multas tributárias;
  8. Créditos subordinados, como os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício.

Como termina a falência?

Depois de concluídas as etapas descritas no tópico anterior, com a venda de todo o ativo e a distribuição do produto entre os credores na devida ordem, o administrador judicial deve apresentar suas contas ao juízo falimentar. 

Essas contas podem ser impugnadas por interessados, mas se forem aprovadas pelo juízo, será elaborado o relatório final da falência, “indicando o valor do ativo e o do produto de sua realização, o valor do passivo e o dos pagamentos feitos aos credores, e especificará justificadamente as responsabilidades com que continuará o falido”.

E com a apresentação desse relatório, a falência será encerrada por sentença do juízo.

No entanto, mesmo que os bens tenham se esgotado, as obrigações da empresa falida só se encerram se houver o pagamento de todos os créditos, ou se, depois da realização do ativo, houver ocorrido o adimplemento de mais de 50% dos créditos quirografários.

Se estas hipóteses não tiverem ocorrido, a extinção das obrigações do falido só ocorre após decorridos 5 anos do fim do processo de falência, se não tiver sido cometido nenhum crime falimentar, ou após 10 anos, caso a prática de algum delito tenha sido constatada.

Ou seja, além de enfrentar um processo longo e desgastante, muitas vezes o falido ainda tem de esperar vários anos depois do fim do processo de falência para se ver totalmente livre das obrigações.